Por: Irene Cavaliere

Foto: Peter Illicciev / Fiocruz

Foto: Peter Illicciev / Fiocruz

Em muitos países, a hanseníase já foi erradicada. Porém, no Brasil,a cada 15 minutos,um novo caso de hanseníaseé detectado (Ministério da Saúde, 2009). Provavelmente, você já ouviu cobras e lagartos sobre a hanseníase – ou lepra -, imaginou pessoas deformadas, e achou que melhor mesmo seria ficar bem longe de alguém doente, para não correr o risco de pegar também.

Antigamente, não havia cura para hanseníase, e quem adoecia ficava condenado à exclusão e aos estigmas físicos e morais da doença. Mas desde seus primeiros registros, no século 6 a.C., até hoje, a ciência avançou, e a cura da hanseníase foi uma das conquistas da medicina. Apesar disso, muitos mitos e preconceitos ainda confundem o conhecimento dos cidadãos – o que prejudica tanto a prevenção quanto o tratamento.

Por desconhecerem os sintomas, por não saberem como é feita a terapia, por vergonha ou medo de sofrerem preconceito, as pessoas deixam de procurar ajuda. Assim, além de sofrerem complicações mais sérias, os doentes continuam transmitindo a doença. O tratamento da hanseníase é demorado, mas é gratuito e certeiro. Se a pessoa se cuidar, vai ficar curada e não precisa se isolar: pouco depois que começa a terapia, a transmissão é interrompida.

Além disso, mesmo não existindo uma vacina específica para a hanseníase, a vacina BCG, contra tuberculose, ajuda na prevenção, pois os agentes causadores dessas doenças são bem parecidos. Assim, os contatos próximos de alguém que contraiu hanseníase devem procurar o posto de atendimento, para serem examinados e, caso não apresentem nenhum sintoma, receberem a vacina como prevenção.

Quanto antes o tratamento for iniciado, melhor pra todo mundo!

O que é a hanseníase?

A hanseníase é realmente uma doença grave, que afeta a pele e os nervos, e, se não tratada, pode provocar sérias sequelas.  Ela é causada por um bacilo do gênero das micobactérias chamado Mycobacterium leprae, que vive e se reproduz no interior das células cutâneas e dos nervos periféricos (aqueles que não estão no crânio nem na coluna vertebral).

Fotomicrografia da bactéria /OMS

Fotomicrografia da bactéria /OMS

O comprometimento desses nervos é a característica principal da doença, podendo provocar incapacidades físicas que evoluem para deformidades, caso a pessoa não seja tratada. As principais manifestações de hanseníase são: formigamento, fisgadas ou dormência nas extremidades; manchas brancas, avermelhadas ou acobreadas, com perda de sensibilidade ao calor, frio, dor e tato; áreas da pele aparentemente normais, mas que têm alterações de sensibilidade e de suor; caroços e placas em qualquer lugar do corpo; diminuição da força muscular.

Contágio

Mancha causada pela doença/OMS

Mancha causada pela doença/OMS

Mas você sabia que, apesar de ser uma doença contagiosa, apenas 10% das pessoas que entram em contato com o bacilo adoecem? O M. leprae é considerado um bacilo de alta infectividade e baixa patogenicidade – isto é, infecta muitas pessoas, mas poucas adoecem. A evolução depende do sistema imunológico de cada um e, apesar de não ser uma doença hereditária, fatores genéticos determinam se um indivíduo é resistente ou suscetível à doença.

Além das características individuais, outros fatores relacionados ao nível de endemia e condições socioeconômicas, de vida, de saúde e um número elevado de pessoas convivendo em um mesmo ambiente influenciam no risco de contágio, porque transmissão se dá através de secreções nasais, gotículas da fala, tosse, espirro, enfim, por meio do aparelho respiratório superior.

O tempo de incubação – ou seja, o tempo que demora para a pessoa começar a apresentar os sintomas – é longo, variando de três a sete anos, e o tratamento precoce é a principal arma no combate à doença, pois além de evitar complicações mais sérias, a pessoa em tratamento já não é mais transmissora. A única maneira de se transmitir a doença é de pessoa para pessoa, embora alguns animais tenham sido identificados como naturalmente infectados, como o tatu.

Diagnóstico e tratamento

Só mesmo um médico pode fazer o diagnóstico de qualquer doença e indicar o tratamento, mas se a pessoa começa a apresentar qualquer alteração de sensibilidade na pele, deve-se desconfiar de hanseníase. Para ter certeza, o médico precisa conversar com o paciente sobre seu histórico de saúde, fazer uma avaliação dermatológica e neurológica, excluir possibilidades de outras doenças e fazer um exame laboratorial pra identificar a presença do bacilo.

A hanseníase tem cura. Antigamente, os doentes eram isolados, tinham suas casas e seus pertences queimados, a família era estigmatizada, enfim, havia um preconceito muito grande em torno da doença (leia mais em Hanseníase na história).

Abrigo para doentes na Índia / Erin Collins (Flicr)

Abrigo para doentes na Índia / Erin Collins (Flicr)

Os avanços das pesquisas mostraram que essas medidas eram ineficazes. Atualmente, o tratamento é feito com a poliquimioterapia (PQT), uma associação de medicamentos padronizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que mata o bacilo e leva à cura. Esse tratamento é oferecido gratuitamente em todas as unidades de saúde.

Já a terapia provou ser eficaz. De 1990, quando a PQT foi introduzida, até 2008, a taxa de prevalência da hanseníase (número de casos por 10 mil habitantes) no Brasil caiu de 19,5 para 2,06. Está próxima da meta estabelecida pela OMS para a erradicação da doença, que é de 1 caso para 10 mil habitantes.

Porém, se considerarmos estatísticas regionais, ainda há locais onde os números preocupam, como em Mato Grosso, que em 2008 registrou uma taxa de prevalência de 8,76 (dados do DataSus). Em 2009, 37.610 novos casos foram registrados no Brasil, a maior taxa de toda a América. Alguns do outros países que ainda sofrem com a hanseníase são Angola, Índia, China, Congo, Madagascar, Moçambique, Nepal, Tanzânia e República da África Central.

Leia também: Hanseníase na história

Saiba mais:

Ministério da Saúde – Guia de Hanseníase

Hanseníase hoje – OMS (em inglês)

Situação da hanseníase no mundo em 2010 – OMS (em inglês e francês)

Guia para identificação – OMS

Tropical disease research. A Global Partnership 8º/ Program.Report of the UNDP/Word Bank/WHO-TDR/1987

Data Publicação: 02/12/2021