Fig 1. Projeto busca estimular a permanência da juventude no campo. Crédito: Acervo ERA

Iniciativas que unem juventude e clima promovem adaptação de escolas para enfrentar o calor, justiça climática e áreas verdes em periferias

A 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30) começou no dia 10 de novembro. O encontro deste ano está sendo realizado no Brasil, mais especificamente, em Belém (PA). A COP30 está reunindo líderes mundiais, cientistas, organizações não governamentais, representantes da sociedade civil de vários países e muitos, muitos jovens. A juventude está por todos os lados. E está agindo!

De acordo com Marcele Oliveira, escolhida a Jovem Campeã do Clima da COP30 a partir de um edital do Governo Federal, quando se fala de mudanças climáticas, é preciso atenção especial aos jovens e crianças. Apenas em 2024, segundo estudo realizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), pelo menos 242 milhões de estudantes tiveram suas rotinas escolares interrompidas. Isso ocorreu por causa de eventos climáticos extremos, como ondas de calor, ciclones, tempestades, inundações e secas.

Diante desse cenário, a jovem de 26 anos destaca ao Invivo:

— Torna-se mais urgente do que nunca incluir as vozes de crianças, adolescentes e jovens nos processos decisórios sobre o clima. Afinal, são esses grupos que já sofrem e continuarão sofrendo por mais tempo os impactos das mudanças climáticas em sua saúde, educação, emprego e renda.

Apesar da urgência de incluir esses grupos nas discussões sobre a crise climática, projetos liderados pela juventude muitas vezes recebem menos investimentos financeiros. Em geral, a verba tende a ser menor porque muitas iniciativas dos jovens são recentes ou estão em estágio inicial. Há, inclusive, um fundo voltado para o financiamento dessas ações.

Vamos conhecer três propostas de juventude e clima para reduzir os efeitos das mudanças climáticas. Dois desses projetos estão sendo apresentados na COP30, representando o Nordeste e o Norte. O terceiro é da Região Sudeste, e seus representantes estão acompanhando os debates à distância.

 

Escola Rural de Ativismo: escolas no Sul da Bahia estão sendo adaptadas para enfrentar efeitos do calor

Fig 2. Reforma em escolas rurais ajudam a deixar ambiente mais adequado a enfrentar o calor. Crédito: Acervo ERA

 

No entorno do Parque Estadual da Serra do Conduru, no Sul da Bahia, a Escola Rural de Ativismo (ERA) e os moradores adaptaram uma instituição de ensino para minimizar o calor crescente, dando mais conforto e dignidade aos alunos.

“Muitas pessoas alcançam saúde quando elas conseguem colocar a esperança em movimento. Queremos contribuir para o aterramento daqueles que querem atuar como agentes de transformação”, explica Joyce Lemos, de 31 anos, uma das fundadoras da ERA.

Ela saiu do Rio de Janeiro há oito anos e se juntou a um grupo de jovens que queria construir formas de enfrentar um contexto de colapso. O time tem uma visão de reocupação ordenada no campo.

Lemos explica o que isso significa na prática:

— Precisamos fazer o esvaziamento ordenado das grandes cidades. Isso também pode gerar problemas para a população mais jovem daquele território, como especulação imobiliária. Reconhecemos que o nosso movimento é elitizado, com muitas pessoas que têm o privilégio de fazer trabalho remoto.

Então, como gerar impactos positivos? Um dos caminhos foi o diálogo direto com a juventude rural dos territórios onde atuavam. O primeiro grande projeto ocorreu no Sul da Bahia, onde criaram uma intervenção numa unidade escolar com os moradores de um assentamento rural.

A escola estava instalada numa antiga barcaça de cacau, espaços que secam o fruto e são comuns em estados produtores. “Não tinha ventilador, o telhado de amianto deixava tudo superquente. Estudos do Unicef dizem que, a partir de 37 graus, já há comprometimento de aprendizagem”, detalha a fundadora.

Voluntários da ERA e moradores se uniram para reformar o lugar. Abertura de janelas, iluminação natural, mais ventilação, novo telhado, tratamento de esgoto e horta alimentar foram soluções incorporadas ao projeto.

Segundo Lemos, que está participando da COP30 em Belém, o campo está cada vez mais vazio e envelhecido. O projeto também tem como objetivo falar e batalhar pelas crianças que crescem nas áreas rurais. A ideia é estimular a permanência da juventude nesse local. A meta agora é reformar mais duas novas escolas em 2026.

 

Coletivo Utopia Negra Amapaense: justiça eleitoral e climática no Amapá

 

 

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A graduanda em história Alicia Miranda, de 27 anos, é moradora do bairro Jesus de Nazaré, em Macapá (AP). Ela vive próximo a um rio canalizado, construído por uma gestão municipal que fez um processo de higienização na cidade. Ou seja, expulsou moradores mais pobres para áreas em situação de maior vulnerabilidade.

“O Amapá é uma ilha cortada por rios. A população que vive em cima das pontes imita um pouco a vida ribeirinha, mas num contexto urbano. O rio está extremamente deteriorado e poluído. Então, vivemos racismo ambiental”, determina Miranda.

O racismo ambiental é a discriminação racial casada à ambiental, que acaba incidindo sobre as populações negras e periféricas que já vivem um contexto de vulnerabilização. É uma grave violação de direitos humanos.

Uma das soluções do Coletivo Utopia Negra Amapaense, do qual Miranda participa, foi levar oficinas sobre justiça eleitoral e climática para escolas. Eles trabalham com jovens a partir de 15 anos. A ideia é debater clima, com o viés de raça e de gênero, mostrando aos estudantes que a pauta ambiental é prioridade.

“Nossas lideranças estão envelhecendo. Nosso próprio movimento precisará ser oxigenado”, explica Miranda. O nome do projeto nas escolas é ‘Circuito Conexões Climáticas’. Nas edições de 2024 e 2025, a justiça eleitoral entrou também como prioridade por causa das eleições municipais do ano passado e o pleito de 2026.

As oficinas começaram em 2022. Em todas, o conceito de racismo ambiental marcou presença. “Conectamos assuntos cotidianos para explicar que as mudanças do clima estão mais próximas do que eles imaginam”, reforça a historiadora.

Nas últimas duas oficinas (2024 e 2025), as informações sobre justiça eleitoral ajudaram aqueles que votariam pela primeira vez. “Todos os nossos representantes do Amapá estão de costas para a gente na questão ambiental. Queremos que esses jovens saibam o básico e busquem planos de governo com boa defesa ambiental”, reforça a jovem.

Até o momento, 600 jovens de escolas periféricas e públicas de Macapá foram atendidos. O coletivo também está marcando presença na COP30. Para Miranda, compreender a linguagem das negociações da COP é difícil, mas é um movimento necessário.

“Acho que nossa juventude não será pacífica, porque o jovem do Norte não tem ‘papas na língua’. Viemos pautar o que queremos, aproveitando que a COP está no Brasil. Se fosse lá fora, teríamos a barreira financeira e do idioma”, destaca Miranda.

 

Agenda Realengo: um parque feito por moradores para moradores no Rio de Janeiro

No mapa do calor de Realengo, bairro na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro (RJ), surge um ponto de alívio. Justamente onde está localizado o Parque Realengo Susana Naspolini, inaugurado em junho de 2024.

 

Fig 4. Mapa do calor de Realengo, bairro na zona Oeste do Rio de Janeiro. No ponto verde do centro, encontra-se o Parque Realengo Susana Naspolini. Crédito: Reprodução da Agenda Realengo 2030

 

O bairro tem poucas árvores e espaços de lazer. O parque, então, ocupou uma verdadeira lacuna. Quem explica é a jornalista Fernanda Távora, de 36 anos, uma das integrantes da Agenda Realengo, um plano popular de planejamento urbano e desenvolvimento local que também batiza um coletivo formado por moradores da região.

No papel, a agenda, que já está em sua segunda edição, traz propostas para Realengo até 2030. O coletivo é apenas um de muitos que lutou pela concretização do Parque de Realengo. Távora explica que a história da Agenda está ligada à história de luta pela implementação da área verde.

A reivindicação dos moradores já existia desde os anos 1980. Eles queriam uma área pública que ocupasse a antiga Fábrica de Cartuchos de Realengo, desativada em 1978 depois de quase 80 anos de atividade. O assunto virou um impasse.

Em 2004, veio a reestruturação da luta por um parque urbano-ecológico, aproveitando a zona verde da localidade. “Em 2019, os próprios moradores acabaram ocupando a área e transformando-a na Ocupação Parquinho Verde”, pontua Távora.

 

Fig. 3: O Parque Realengo nasceu da luta de moradores e jovens ativistas locais. (Crédito: William Crem)

 

Após intensa luta e inauguração do Parque em 2024 – uma vitória dos moradores e dos movimentos populares –, a ideia é batalhar pela criação de um centro de cultura e memória de Realengo no mesmo local. Segundo Távora, o projeto ainda está sendo pensado pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

Segundo a jornalista, o parque vem com uma proposta de promover justiça socioambiental:

— Quem mora na Zona Oeste faz um movimento pendular: sai daqui para trabalhar em outros locais do Rio. Não sobra tempo para fazer outras coisas e, em Realengo, não há muita estrutura de cultura, arte e lazer.

Ela acrescenta que o parque ocupou esse lugar de convívio, lazer e aproximação da natureza.

O coletivo da Agenda Realengo não está presente na COP30. Mesmo assim, Távora espera que o evento visibilize as soluções para a crise ambiental, que vêm de quem vivencia o território.

 

Por Renata Fontanetto, parceira do Invivo na COP30, direto de Belém (PA).

Data Publicação: 13/11/2025