Fig 1. Projetos sobre o Cerrado melhoraram habilidades de socialização e interação de estudantes com e sem deficiência. Crédito: Acervo pessoal

 

Alunos aprenderam sobre o bioma e melhoraram a forma como lidam com suas emoções

Esse texto faz parte de uma série de reportagens produzidas a partir de trabalhos premiados no 13º Circuito de Ciências das Escolas Públicas do Distrito Federal, uma ação da Secretaria de Educação do DF.

Como o Cerrado se relaciona com as emoções humanas? Uma proposta escolar inovadora mostra que esses dois campos têm muita conexão. O projeto “As emoções do Cerrado sob a perspectiva da inclusão”, realizado no Centro de Ensino Fundamental 16 de Taguatinga, possibilitou não só ampliar os conhecimentos sobre o bioma, mas também melhorar a habilidade de estudantes com transtorno do espectro autista (TEA) para identificarem e lidarem com suas emoções.

A iniciativa foi uma das ganhadoras do 13º Circuito de Ciências das Escolas Públicas do Distrito Federal, em 2024. O trabalho foi premiado na categoria G, que engloba Centros de Ensino Especial, Salas de Recursos, Salas de Apoio à Aprendizagem e Classes Especiais, além da Educação de Jovens e Adultos Interventiva.

Pessoas com TEA enfrentam desafios relacionados à expressão de emoções e à interação social. Ao fortalecer essas habilidades socioemocionais nos estudantes, o projeto teve impacto positivo, também, no aprendizado e no rendimento escolar dos alunos. “Construímos o projeto a partir das necessidades dos nossos estudantes, especialmente os com deficiência intelectual e os que estão no espectro autista”, conta a professora Miriam Ferreira Leal, responsável pelo projeto, ao lado do professor Fernando Fournier. E ela acrescenta:

— O maior desafio foi encontrar estratégias para que todos os estudantes, com diferentes perfis e necessidades, participassem ativamente das atividades. Cada estudante se engaja de uma forma, e precisamos adaptar constantemente as propostas para garantir que todos se sentissem incluídos.

Desenvolvido ao longo de várias aulas, o projeto começou com uma pesquisa na internet sobre o Cerrado. A leitura de textos e a observação de imagens e vídeos proporcionaram aos estudantes um panorama geral sobre o bioma e sua importante biodiversidade.

Também foi realizada contação de histórias que falavam de emoções e tinham animais do Cerrado como personagens. Uma das atividades de que mais gostaram foi criar um tangram, um quebra-cabeça chinês. O recurso lúdico foi construído a partir da associação de imagens de animais, formas geométricas e representações de emoções, estimulando a criatividade e o raciocínio lógico.

 

Fig 2. Alunos criaram tangram, usando imagens de animais do Cerrado. Crédito: Acervo pessoal

 

Outra atividade prática foi a construção de uma árvore das emoções. A tarefa foi executada após muita pesquisa sobre os frutos do Cerrado. Para montar o tronco da árvore, os estudantes utilizaram gravetos recolhidos na escola. Já a copa foi composta por faces que expressavam diferentes sentimentos, como alegria, raiva, surpresa, entre outros.

 

Fig 3. Em detalhe, a árvore das emoções criada pelos alunos do Centro de Ensino Fundamental 16 de Taguatinga. Crédito: Acervo pessoal

 

Como resultado, o projeto aumentou não só a consciência ambiental dos participantes, mas também seu repertório socioemocional e sua autoestima. “O projeto contribuiu de forma positiva porque demonstrou que as crianças que possuem alguma deficiência ou TEA conseguem desenvolver trabalhos e mostrar suas habilidades, por meio da inclusão social, apoiada na escola. Trabalhos como esse ampliam a visão delas para o mundo e a visão do mundo para elas”, destaca Elislei de Oliveira Silva dos Santos, mãe do jovem Calebe Oliveira Silva, um dos participantes do projeto, que tem TEA nível 1.

“Gostei do Circuito de Ciências. Até hoje eu fico lembrando”, diz o jovem Calebe Oliveira Silva, hoje com 13 anos e no 8º ano, referindo-se, em especial, à exposição do trabalho na etapa distrital do Circuito, durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. “Apresentei sobre as queimadas, que não pode ficar poluindo, e também sobre as emoções do Cerrado, o que faz raiva para os bichos, o que os deixa alegres ou tristes. A gente aprendeu muita coisa”, afirma o estudante.

Para a professora Miriam, a valorização da diversidade foi um dos principais benefícios do projeto:

— Um ponto muito especial foi perceber como a convivência entre estudantes com e sem deficiência se fortaleceu: houve troca, apoio e reconhecimento das diferenças, criando um ambiente em que todos puderam aprender uns com os outros e se sentir parte do mesmo processo, destaca.

A professora acrescenta ainda que, para os estudantes com TEA, o projeto foi especialmente importante, pois ofereceu um caminho prático e concreto para compreenderem emoções e se expressarem em grupo.

Alunos também conheceram a importância do Cerrado como fonte de água

Um projeto que oferece a crianças e adolescentes diferentes formas de aprender e se expressar faz com que eles se engajem nas atividades. E foi o que ocorreu também no projeto “Cerrado: o berço das águas brasileiras”, realizado no Centro de Ensino Fundamental 20 de Ceilândia. O trabalho ficou em primeiro lugar na categoria G do 13º Circuito de Ciências das Escolas Públicas do Distrito Federal, no ano passado.

A proposta motivou tanto os alunos participantes que, logo que as atividades encerraram, eles já queriam iniciar um novo projeto para o Circuito de 2025. “A cada etapa, foi gratificante ver o empenho e a superação dos estudantes”, diz a professora Adriana Gomes Pereira Araújo, uma das responsáveis pelo projeto que destacou a importância do Cerrado para a manutenção dos níveis de água no Brasil.

Esse bioma abriga três dos principais aquíferos do país – Bambuí, Urucuia e Guarani -, grandes reservas de água subterrâneas, fundamentais para o fluxo dos rios. No Cerrado, também, estão as nascentes dos rios de várias das principais bacias hidrográficas do país. Por isso, ele é chamado ‘berço’ das águas brasileiras, mas está ameaçado pelo rápido avanço do desmatamento, que já se reflete na redução do volume de água dos rios.

Porém, antes de concentrarem sua atenção no Cerrado, os estudantes fizeram pesquisas na internet e montaram um mural sobre todos os biomas brasileiros.

Fig 4. Mural do projeto “Cerrado: o berço das águas brasileiras”. Crédito: Acervo pessoal

 

Para uma maior experiência com o Cerrado, o bioma onde vivem, os alunos visitaram o Parque Ecológico do Cortado, onde está situado o Ribeirão do Cortado e várias nascentes de água. “A visita ao Parque do Cortado e o acesso a uma nascente foi a etapa que mais despertou o interesse. Eles ficaram encantados em ter contato com a natureza, observando o canto dos pássaros, o barulho da nascente, o vento nas folhas”, recorda a professora Adriana.

As atividades envolveram, ainda, a construção de uma maquete que ilustrava o solo e as raízes das plantas do Cerrado, demonstrando seu papel na retenção da água e na formação e preservação dos aquíferos. Dessa forma, buscava-se mostrar a importância de preservar a vegetação nativa e o impacto das ações humanas sobre os recursos hídricos e sua sustentabilidade. O trabalho também foi apresentado na Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, na etapa distrital. “Quando os avaliadores chegavam ao estande, faziam perguntas e os estudantes respondiam com firmeza e segurança”, ressalta Adriana.

 

Fig 5. Alunos do Centro de Ensino Fundamental 20 de Ceilândia produziram maquete do solo e das raízes das plantas do Cerrado. Crédito: Acervo pessoal

 

Entre esses estudantes, estava Lindsay Costa Almeida, hoje com 15 anos e no 9º ano. “Gostei muito e aprendi coisas que eu não sabia, como, por exemplo, sobre a água virtual”, diz a jovem. Com desenvoltura, ela explica que a água, além daquela que usamos para lavar as mãos ou os alimentos, também é utilizada direta ou indiretamente nos processos de produção de bens e serviços. Esse grande consumo nem sempre é visível ou percebido pelas pessoas, daí o nome ‘água virtual’. “A gente gasta muita água e é importante economizar”, ressalta Lindsay. “Gostei muito de ter estudado e apresentar para outras pessoas que não sabiam”, conclui.

De acordo com a mãe de Lindsay, Viviane Maria Costa de Araújo, a abordagem prática do projeto facilitou a compreensão do conteúdo pelos estudantes, mas esse não foi o único benefício que ele proporcionou. “Vi nesse projeto um facilitador da inclusão, pois minha filha, que tem TEA, pôde participar, ter contato com outras pessoas do meio escolar e fora da escola, e superar o desafio da socialização”, explica Viviane.

A professora Adriana concorda. Para ela, o projeto contribuiu para o desenvolvimento de habilidades como socialização, colaboração, comunicação e argumentação, além do pensamento científico. A equipe era formada por quatro alunos com deficiência (física, intelectual e TEA), entre 12 e 16 anos, do 6º e 8º ano.

— Os estudantes tiveram acesso a espaços e situações que, antes, eram desconhecidos por eles. Tudo era novidade! Desde a ida ao parque e andar de van, até expor um projeto na Semana Nacional de Tecnologia. Quando se fala em inclusão, não é somente oportunizar o estudante estar presente, mas oferecer condições e eliminar as barreiras para que ele permaneça e se sinta pertencente àquele meio, sublinha a professora.

Adriana conduziu o projeto em parceria com a colega Adriana Veríssimo Araújo, ambas professoras-orientadoras da Sala de Recursos Generalista do Centro de Ensino Fundamental 20 de Ceilândia, uma escola de horário integral. A Sala é um espaço dentro da escola equipado para desenvolver as potencialidades de estudantes com necessidades educacionais especiais.

Outro projeto premiado na categoria G do 13º Circuito de Ciências das Escolas Públicas do Distrito Federal, em 2024, foi realizado no Centro de Ensino Especial 01 do Guará. Intitulado “Jardins no ar: uma jornada sustentável e inclusiva com hortas suspensas em garrafas PET”, ele foi orientado pelas professoras Celia Andreza Alves Almeida e Ana de Lourdes Conde Barroso.

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Por Fernanda Marques, do Núcleo de Educação e Humanidades em Saúde (Jacarandá) da Escola de Governo Fiocruz – Brasília

Data Publicação: 30/09/2025