Por: Irene Cavaliere*

Brachycola tuberculata

Brachycola tuberculata

Nem todas as baratas são feias e nojentas como as que vivem nas cidades. Existem mais de 4 mil espécies de baratas e, acredite, algumas são até simpáticas. Das conhecidas, menos de 40 são consideradas pragas urbanas.

Apesar da grande variedade de espécies, todas as baratas são onívoras, isto é, comem qualquer coisa que para elas tenha algum valor nutritivo. Mas, diferente das baratas urbanas (ou domésticas), que se alimentam de tudo e mais um pouco – queijo, cerveja, cremes, cola, cabelo, pele, cadáveres, papel, excrementos, sangue, insetos mortos, resíduos de lixo ou esgoto -, as baratas silvestres (ou do mato) preferem raízes de plantas e fungos.

Comparações entre baratas domésticas e baratas do mato são difíceis de se fazer, devido a escassez de estudos e grande variedade de espécies. No entanto, uma diferença entre elas estaria nos hábitos. As espécies urbanas mais conhecidas preferem passear à noite, mas, entre as silvestres, a atividade diurna também pode ser observada. Segundo a pesquisadora Suzete Bressan, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, da UFRJ, há ainda espécies que se mantêm ativas tanto no período diurno quanto noturno.

Phorapis picta

Phorapis picta

A pesquisadora explicou que os hábitos das baratas fazem parte de uma estratégia de sobrevivência aos diferentes ambientes que encontram. A atividade preferencialmente noturna das baratas urbanas, então, também seria uma adaptação: baratas não gostam de luz, nem de encontrar com humanos, por isso, ficaram nas cidades aquelas que de dia descansavam, protegidas da luz solar, e de noite saíam por aí atrás de comida e parceiros.

Seja como for, baratas gostam de se esconder, sempre evitando a luz e buscando umidade. Nas cidades, seus esconderijos preferidos são galerias subterrâneas e esgotos, ou seja, lugares quentes, úmidos, escuros e, em geral, não muito limpos. Já no mato, as baratas se abrigam entre restos de vegetação, sob pedras ou cascas de árvores. Assim, possivelmente devido ao estilo de vida mais higiênico das baratas silvestres – e mais distante das cidades também – não há registros de doenças transmitidas por elas.

Espécie não-identificada

Espécie não-identificada

Segundo Suzete, as baratas exibem uma estrutura social descrita como solitária, gregária e subsocial. Ou seja, elas vivem em bandos, mas não são seres sociais, como as formigas e as abelhas, que se organizam em colônias onde cada um tem sua função. A pesquisadora explicou que as condições ambientais e o estágio no ciclo de vida podem influenciar no comportamento gregários das espécies.

No entanto, ressaltou a pesquisadora, faltam estudos de interação social em relação às inúmeras espécies de baratas. “Muitas tentativas têm sido realizadas para se caracterizar um ferômonio de agregação em espécies consideradas pragas urbanas. Os resultados têm sido contraditórios. Há evidências de que substâncias fecais estimulem o comportamento gregário, que é mediado por estímulos visuais, acústicos, táteis e olfativos, mas não se pode afirmar que o comportamento gregário seja uma adaptação ou uma caraterística das espécies”, esclareceu Suzete.

Equilíbrio ecológico

Petasodes dominicana

Petasodes dominicana

Urbanas ou silvestres, até as baratas têm importância no meio ambiente. Sua principal função é a reciclagem de detritos, digerindo restos orgânicos que servirão de nutrientes para plantas, além de serem, elas mesmas, alimento para várias outras espécies.

A vespa é o principal predador das baratas, conseguindo acabar com uma ninhada inteira antes mesmo de elas nascerem. A vespa coloca seu ovo no interior da ooteca – estrutura de cálcio onde os ovos das baratas ficam armazenados. Quando a larva da vespa nasce, se alimenta dos embriões da barata, destruindo de uma vez só toda a descendência de sua presa. Além das vespas, formigas, escorpiões, aranhas, lagartixas, ratos e morcegos são alguns dos que se alimentam de baratas.

Apesar de as baratas urbanas não serem nada agradáveis de se conviver, sua extinção causaria, por exemplo, um desequilíbrio na população de lagartixas e morcegos, ou poderia acarretar no acúmulo de resíduos humanos em esgotos e cemitérios. Por outro lado, extinguir as baratas das cidades não seria uma tarefa fácil: cada barata fêmea deixa, em média, 750 filhotes na vida, considerando que ela viva um ano, o que pode variar de espécie para espécie.

Estrutura física e desenvolvimento

Espécie não-identificada

Espécie não-identificada

O tamanho das baratas também varia muito: de milímetros até 10 centímetros, dependendo da espécie. Elas não possuem um esqueleto interno, mas sim um tipo de carapaça externa dura e impermeável. É o chamado exoesqueleto, que serve para sustentar o corpo e auxiliar na locomoção.

Uma vez formado, o exoesqueleto não cresce: para se desenvolver, as baratas trocam de carapaça várias vezes na vida, formando um exoesqueleto maior. Seu crescimento se dá em três estágios: ovo, antes do nascimento; ninfa, quando apresenta características de adulto pouco desenvolvidas; e imago, fase adulta do inseto.

É no período de ninfa que nascem as asas, normalmente mais desenvolvidas nos machos. Os machos costumam ser menores do que as fêmeas, e são eles os principais responsáveis pelo “cheiro de barata”, que serve para afastar intrusos e predadores e é emanado de glândulas que ficam no abdome. Essas glândulas são mais desenvolvidas nos machos e o próprio nome já diz: glândulas repugnatórias, que também existem em outros tipos de insetos.

Tribonium

Tribonium

Coleção entomológica

No acervo da Coleção Entomológica do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), encontram-se aproximadamente 210 exemplares de baratas, embora nem todas as espécies já tenham sido identificadas. As fotos que ilustram este artigo foram tiradas na coleção.

Amostras de baratas da coleção do IOC

Amostras de baratas da coleção do IOC

Com 110 anos de história, a coleção do IOC possui um acervo de cerca de 5 milhões de insetos. Uma coleção entomológica armazena, de forma organizada, exemplares de insetos preservados para estudos científicos, sendo um importante registro da existência de espécies no tempo e no espaço.

Panchlora nivea e a Blaberus giganteus estão na coleção. Essas duas espécies têm sido até mesmo comercializadas como animais de estimação exóticos em alguns países. Saiba mais sobre elas:

Panchlora nivea

Panchlora nivea

Panchlora nivea: mais conhecida como barata verde ou barata cubana, é uma pequena espécie encontrada em habitat de clima tropical e subtropical, principalmente Cuba e outras ilhas do Caribe. As fêmeas atingem o tamanho de 2,4cm e os machos medem de 1,2 a 1,5cm de comprimento. De cor verde-clara, raramente são encontradas em ambientes urbanos, e vivem em arbustos, árvores e plantas. Possuem hábitos noturnos e são atraídas por luzes brilhantes.

Blaberus giganteus

Blaberus giganteus

Blaberus giganteus: é uma das maiores espécies do mundo, podendo chegar a 9,0cm de comprimento. Encontradas em áreas tropicais, em florestas da América Central e na região Amazônica, gostam de ambientes silenciosos, vivendo em cavernas escuras e úmidas.

Outras espécies

Veja fotos de algumas outras espécies diferentes que encontramos na coleção do IOC.

Monachoda sp

Monachoda sp

Monastria biguttata

Monastria biguttata

Eushelfordia sp

Eushelfordia sp

Ninfas

Ninfas

*Pesquisa: Maria Clara Guimarães, Ismael Tinoco e Irene Cavaliere / Texto: Irene Cavaliere

Consultoria: Danielle Cerri (Coleção Entomológica do Instituto Oswaldo Cruz), Suzete Bressan (Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho – UFRJ), Leonardo de Oliveira Cardoso da Silva (Dept. Entomologia, Lab.Blattaria, Museu Nacional, UFRJ), Flávio Matakanskas de Oliveira (Museu de Zoologia da USP).

Fontes

ROCHA, Rosana Moreira e COSTA, Cibele S. Ribeiro. “Invertebrados: Manual de Aulas Práticas”. Série Manuais Praticos em Biologia-3. Editora: Holos, Ribeirão Preto, 2002.

LENKO, K.; PAPAVERO, N. Insetos no folclore. São Paulo: Editora Plêiade, 1996. 467p.

MARICONI, F.A.M. Insetos e outros invasores de residências. Piracicaba: FEALQ, 1999. 460p.

NOLASCO, S. A vida secreta das baratas. Vetores & Pragas, v. 2, n. 5, p. 14-15, 1999

Data Publicação: 23/11/2021