Por: Vânia Rocha
Voltar para casa, depois de um dia de trabalho e encontrar um casal de papagaios sobrevoando edifícios, visitar um amigo e cruzar com um grupo de macacos-prego saltando de galho em galho ou ainda, curtir uma praia num fim de semana e avistar uma orca e seu filhote são cenas possíveis de acontecer na cidade do Rio de Janeiro.
Macacos, morcegos, gambás, botos, baleias, papagaios, gaviões e até jacarés podem ser encontrados nas áreas urbanas da cidade com certa frequência e acabam virando notícia em jornais e na TV. Mas por que isso acontece? Devemos ficar contentes por conviver de perto com espécies da nossa fauna ou esta aproximação pode nos trazer problemas?
Bem, antes de qualquer coisa é preciso entender que nossa cidade repleta de edifícios, avenidas, viadutos, automóveis e tantas outras construções já foi uma paisagem característica da Mata Atlântica. O bairro super movimentado onde você mora, a rua da sua escola ou o seu agitado local de trabalho é o resultado da urbanização. Em outras palavras, o ambiente em que vivemos era, no passado, uma floresta repleta de espécies nativas, que foi se transformando ao longo do tempo na grande metrópoles de hoje.
A Biodiversidade ou Diversidade biológica pode ser compreendida como a variabilidade de organismos vivos presentes nos ecossistemas terrestres ou aquáticos. Falando mais claro, biodiversidade refere-se à variedade de vida no planeta Terra, incluindo a variedade genética dentro das populações e espécies. Quando nos referimos à biodiversidade, estamos falando sobre as diversas espécies da flora, da fauna, dos fungos, dos microrganismos e de todas as espécies vivas que convivem em um determinado ecossistema. Estas espécies vivem em ambientes como florestas, cerrados, campos, mares ou lagos e desempenham funções biológicas, garantindo sua sobrevivência. A Biodiversidade inclui, assim, a totalidade dos recursos vivos e genéticos e seus componentes, as espécies.
Ao ocupar estes ambientes, o homem causou alterações desastrosas. Além de levar várias espécies à extinção, as áreas ocupadas por estes animais se tornaram cada vez mais restritas. Atualmente, nas áreas urbanas, podemos contar com os parques e outras Unidades de Conservação, isto é, áreas protegidas por leis ambientais. Estes são um dos poucos refúgios destas espécies. Nas cidades, porém, as áreas protegidas são, em geral, rodeadas de condomínios, indústrias, favelas e vias expressas. Muitas delas acabam sendo realmente invadidas por famílias que não têm onde morar. No entanto, há situações inversas, como o caso dos condomínios luxuosos que constroem casas e prédios em áreas verdes e cobram altos valores pelos imóveis.
As espécies de animais procuram, então, se movimentar em busca de alimento, abrigo, companheiros para procriação e, muitas vezes, acabam da nossa casa, no trabalho, na escola, praça ou praia que freqüentamos. Na verdade, nós continuamos invadindo seus ambientes, como no passado e os animais seguem fazendo as atividades que os mantêm vivos, como transitar, comer e suprir suas necessidades básicas.
Presenciar animais da nossa fauna tão perto de nós é uma sensação gostosa e emocionante; afinal, fazemos também parte da natureza. Porém, este convívio nem sempre é harmonioso. Na maioria das vezes isso tem se tornado um problema ambiental sério e, portanto, requer análise cautelosa e ações que evitem a exposição de pessoas a algum risco, sem prejudicar o bem-estar e a sobrevivência destes animais.
Recentemente pudemos acompanhar nos jornais o caso de um gavião-carijó (Rupornis magnirostris) que sentiu-se ameaçado e, para defender-se, acabou ferindo moradores de um bairro da Zona Norte do Rio. Os gaviões são aves com excelente visão e por isso precisam de áreas abertas para se abrigar, como topos de prédio, postes e antenas. São carnívoros e ótimos caçadores e ajudam a equilibrar populações de ratos e insetos indesejáveis no ambiente urbano. Contudo, atacam quem se aproxima para defenderem seus filhotes.
O Galeão é um dos aeroportos que mais registra choques de aviões com aves, não apenas urubus atraídos por carniça e lixões, mas também quero-queros, biguás e garças a caminho de suas áreas de alimentação.
Já na Zona Oeste, a surpresa de um morador foi encontrar um jacaré do papo amarelo (Caiman latirostris) numa lagoa perto de casa. Esta é mais uma conseqüência da destruição dos mangues, da canalização de pequenos rios, do aterramento de estuários e da poluição dos ambientes aquáticos.
Devemos tomar cuidado com a possibilidade de transmissão de doenças, pois algumas espécies de animais silvestres trazem este risco quando se aproximam de nós. A raiva é um exemplo. A transmissão ocorre quando o vírus da raiva, existente na saliva do animal infectado, penetra no nosso organismo. Isso pode acontecer por meio de mordedura, arranhadura, ou lambedura. No Brasil, o principal transmissor no meio urbano é o cão doméstico. No entanto, animais silvestres como morcegos e macacos são reservatórios do vírus e, quando contaminados, podem transmiti-lo.
Entre as moléstias associadas a animais silvestres, figuram também a criptococose (inalação de esporos de fungos associados a resíduos de aves), as hantaviroses (contato com secreções e excreções de roedores) e as leishmanioses (cujos reservatórios naturais são roedores e gambás).
O desafio é manter uma convivência harmoniosa com estes animais, enquanto buscamos soluções para conservar a biodiversidade em áreas urbanas.
Imagens:* Foto: Dario Sanches/Wikipedia
** Foto: Wagner Machado Carlos Lemes/Wikipedia
***Foto: Gagea/Wikipedia
Para saber mais::
Ministério do Meio Ambiente
Por causa de desmatamento, Rio tem invasão de animais selvagens
Data Publicação: 23/11/2021