Por: Sarita Coelho

Múmia natural encontrada no Brasil (acervo Fiocruz)
Sociedades incas que ocuparam a América do Sul no século 13, populações japonesas de 400 a.C. e até mesmo as múmias, que habitaram o Egito há 2.700 anos, já apresentaram doenças e infecções provocadas por parasitos. Esses animais dependem de outros organismos para viver e afligem a Humanidade desde os tempos mais remotos. Mas, como será que os pesquisadores conseguem descobrir a ocorrência de doenças parasitárias em épocas tão antigas?
Através da paleoparasitologia, os cientistas conhecem a origem e a evolução das doenças parasitárias. Essa ciência, que nasceu no Brasil, se ocupa de estudar os parasitos encontrados em materiais arqueológicos, mais precisamente em coprólitos, fezes petrificadas (copro = fezes; litos = pedra). Isso mesmo! Eles estudam o cocô das múmias!!
Por incrível que pareça, as fezes são ótimas fontes de informação sobre os hábitos do ser humano. Por meio delas é possível identificar pedaços de plantas, restos de comidas e carapaças de insetos. Regiões de climas áridos (como os desertos) ou gelados (como as montanhas) são ideais para a conservação dos resquícios paleoparasitológicos.

Exemplos de fezes fossilizadas com mais de 7500 anos
Para retirar esses materiais, o paleoparasitologista realiza expedições junto com outros profissionais em busca dos vestígios deixados pelas civilizações antigas. O paleoparasitologista Adauto Araújo, da Fiocruz, conta que já acompanhou escavações realizadas no sertão do Piauí e em sambaquis – depósitos de conchas, restos de comida e esqueleto deixados por tribos que habitaram as Américas na pré-história – do Rio de Janeiro.
Mas não só de viagens vivem os paleoparasitologistas! Eles também passam horas nas bibliotecas lendo informações sobre os hábitos e costumes dos povos daquela época; participam de estudos feitos em corpos mumificados nos museus; e analisam no microscópio os restos de insetos encontrados.
A genética também pode ser uma grande parceira para os estudos paleoparasitológicos. Ao se comparar o DNA do parasito encontrado na pré-história e o DNA do parasito atualmente, é possível determinar as mudanças evolutivas da espécie.
Depois de levantar todos esses dados, o paleoparasitologista interpreta os indicadores e monta sua conclusão final. Dessa maneira, já se conseguiu descobrir diversos aspectos da vida das civilizações antigas.
A análise do pólen encontrado em sedimentos do Piauí, por exemplo, mostrou que os povos pré-históricos da região usavam plantas para curar suas doenças; outro estudo pôde comprovar que a lombriga (Ascaris lumbricoides) foi introduzida no Japão quando o país começou a importar plantações de arroz da China.

Ovo de um Ascaris lumbricoides, conhecido como lombriga
Assim, os estudos paleoparasitológicos mostram como surgem as doenças infecto-parasitárias, como se espalham e como desaparecem por meio dos indícios. A presença de parasitos em alguma civilização revela, por exemplo, que ali existiam condições sanitárias precárias.
Também é papel dessa ciência descobrir os parasitos que já desapareceram com a extinção de seu hospedeiro ou com a mudança de clima. Sabe-se que o mocó, um mamífero que vive na caatinga, sofreu com a existência de um parasito intestinal até oito mil anos atrás. Com o tempo, o clima na região se tornou mais seco e o parasito desapareceu.
Desse modo, a paleoparasitologia pretende dar sua contribuição à medicina, à arqueologia, à geografia e à história, determinando as rotas que a Humanidade seguiu de acordo com os parasitos típicos de cada clima ou região.
Quem diria que os parasitos que tanto nos incomodam poderiam ser tão importantes para o conhecimento da saúde de nossos antepassados!
Data Publicação: 30/11/2021