Mulher negra, de cabelo preso e com roupa de ginástica, realiza alongamento no chão de uma sala, diante de um notebook. A sala possui paredes brancas, plantas e um sofá com almofadas amarelas. Créditos: Cameron Prins/iStock

Fig 1. A prática de exercício em casa cresceu durante a pandemia de Covid-19. Crédito: Cameron Prins/iStock

 

Cérebro e exercício: diversos benefícios

“Malhar o cérebro” vai além de apenas realizar ações que enriquecem o intelecto. Fazer atividades físicas pode oferecer inúmeros benefícios para a mente. Isso vale não apenas para exercícios realizados na academia, parques e praias, mas até mesmo em jogos de realidade virtual e em aulas práticas on-line.

Segundo a Dra. Andrea Deslandes, professora do Instituto de Psiquiatria e do Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria e Saúde Mental (PROPSAM) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do Laboratório de Neurociência do Exercício (LaNEx/UFRJ),essas ferramentas que demandam a execução de movimentos em conjunto com uma maior necessidade de raciocínio, ou seja, que exigem uma dupla tarefa, têm se mostrado especialmente boas para o funcionamento cerebral.

Mas outros exercícios também são benéficos para o cérebro. É o caso de atividades aeróbicas que envolvem movimentos cíclicos e repetitivos, como caminhada, corrida e andar bicicleta, e atividades ao ar livre, práticas aquáticas e até treinamento de força.

 

Como o exercício físico estimula o cérebro?

Cérebro e exercício estão associados. A atividade física faz os músculos se contraírem diversas vezes. Estudos indicam que essas contrações estimulam a produção de substâncias importantes para a saúde. “De alguma forma, o músculo produz substâncias chamadas de miocinas, que são citocinas, ou seja, proteínas excretadas por células. Elas vão favorecer o funcionamento do cérebro, por exemplo, criando novos circuitos (neuroplasticidade) e novos vasos sanguíneos cerebrais”, explica a Dra. Andrea em entrevista ao portal Invivo.

Entre as miocinas, há aquelas que estão associadas à formação de novos neurônios, que são as células que compõem o cérebro. Eles são formados principalmente no hipocampo, área cerebral que está associada a diferentes funções, entre elas, a memória e os sentimentos.

Outra miocina produzida durante a prática de exercício físico é a irisina. Estudos em animais revelam que a irisina melhora a comunicação entre os neurônios, protege o cérebro contra a perda da capacidade de armazenar informações e também parece ajudar a restaurar a memória perdida.

O exercício físico atua ainda na modulação de neurotransmissores, substâncias que atuam como mensageiros químicos produzidos por neurônios. “Neurotransmissores como dopamina, noradrenalina e serotonina, que são aumentados durante o exercício físico, regulam sono, apetite, prazer, humor, o que pode justificar como a atividade física também é capaz de aumentar a motivação e a atenção”, explicou a Dra. Andrea, que é graduada em educação física, mestre e doutora em saúde mental.

Os efeitos do exercício se estendem também às estruturas cerebrais. A Dra. Andrea explicou que, além do hipocampo, há impactos positivos no corpo estriado, importante área do circuito motor, e no córtex pré-frontal, região que está relacionada ao humor, ao afeto e também às funções executivas. “Entre as funções executivas, estão o controle inibitório, a memória operacional e a flexibilidade cognitiva, habilidades muito importantes para o convívio em sociedade. O exercício físico vai modular essa área e também vai beneficiar essas funções”, explicou a professora. Além disso, o córtex pré-frontal é uma das primeiras regiões a sofrer perda neuronal com o envelhecimento, mas o exercício consegue reduzir a velocidade desse declínio.

 

 

Benefícios em todas as idades

Segundo a Dra. Andrea, o exercício físico, principalmente de intensidade moderada, melhora o desempenho, por exemplo, das funções cognitivas, ou seja, percepção, atenção, memória, linguagem, funções executivas e aprendizagem. Melhora ainda o humor, reduz a ansiedade e possui um papel protetor com relação aos transtornos mentais e ao declínio cognitivo. “Ele também pode servir como uma terapia adicional no tratamento de transtornos mentais, sendo que atualmente os estudos mostram a maior evidência na prevenção e no tratamento dos transtornos depressivos”, destacou, lembrando que a literatura também tem apontado benefício no tratamento de demências, como Alzheimer, em casos de declínio cognitivo leve e ainda na esquizofrenia, nos transtornos de ansiedade, no transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e no transtorno do espectro autista (TEA).

Os benefícios da combinação cérebro e exercício atingem desde crianças até idosos. “Essa é uma questão que precisa ser trabalhada na sociedade desde a infância, desde a escola para que as atividades sejam inclusivas, prazerosas”, destacou a Dra. Andrea.

 

Qual é a frequência ideal de exercícios para uma boa saúde cerebral?

O Guia de Atividade Física para a População Brasileira, do Ministério da Saúde, recomenda a prática de pelo menos 150 minutos de atividade física por semana. No caso de crianças e adolescentes, a orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de 300 minutos semanais.

Parece muito? Calma, o importante é não ficar parado e começar, independente da idade. “Estudos na área de saúde mental têm mostrado que sessões de exercício de cerca de 30 minutos três vezes por semana já são suficientes para reduzir sintomas depressivos e de ansiedade. Ainda não temos uma recomendação única, específica para saúde mental, mas, de um modo geral, a literatura vem mostrando um efeito muito benéfico desde duas vezes até cinco vezes por semana, de 30 a 60 minutos por sessão”, destacou a Dra. Andrea.

 

Fontes consultadas:

Dove E, Astell A. The Use of Motion-Based Technology for People Living With Dementia or Mild Cognitive Impairment: A Literature Review. J Med Internet Res. 2017;19(1):e3. doi:10.2196/jmir.6518
Astell A, Czarnuch S, Dove E. System Development Guidelines From a Review of Motion-Based Technology for People With Dementia or MCI. Front Psychiatry. 2018;9. doi:10.3389/fpsyt.2018.00189

Rocha L. Hormônio induzido por exercício pode atenuar o Alzheimer. Fiocruz. https://portal.fiocruz.br/noticia/hormonio-induzido-por-exercicio-pode-atenuar-o-alzheimer. Publicado em 22 de janeiro de 2019. Acessado em 02 de março de 2022.

Reynolds G. Como o exercício físico pode fazer bem ao cérebro e evitar perda de memória. Viva Bem UOL. https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2019/01/23/como-o-exercicio-fisico-pode-fazer-bem-ao-cerebro-e-evitar-perda-de-memoria.htm?cmpid=copiaecola. Publicado em 23 de janeiro de 2019. Acessado em 02 de março de 2022.

Moraes H, Silveira H, Oliveira N et al. Is Strength Training as Effective as Aerobic Training for Depression in Older Adults? A RandomizedControlledTrial. Neuropsychobiology. 2019;79(2):141-149. doi:10.1159/000503750
de Oliveira Silva F, Ferreira J, Plácido J et al. Three months of multimodal training contributes to mobility and executive function in elderly individuals with mild cognitive impairment, but not in those with Alzheimer’s disease: A randomized controlled trial. Maturitas. 2019;126:28-33. doi:10.1016/j.maturitas.2019.04.217

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Departamento de Promoção da Saúde. Guia de Atividade Física para a População Brasileira [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Departamento de Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2021. http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_atv_populacao.pdf

 

Por Teresa Santos

 

 

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Data Publicação: 30/03/2022