Imunossuprimidos, imunodeprimidos ou imunocomprometidos: quando a defesa do organismo falha

Quem acompanhou as notícias sobre a pandemia de Covid-19, provavelmente, deve ter ouvido as palavras ‘imunossuprimidos’, ‘imunodeprimidos’ ou ‘imunocomprometidos’. Apesar de terem ganhado maior destaque nesse período, essas palavras vão muito além da Covid-19.

Você já pegou uma gripe e se recuperou alguns dias depois? Agradeça ao seu sistema imunitário, responsável por combater microrganismos causadores de doenças. Porém, nem sempre o sistema imunitário funciona corretamente. Quando ele está enfraquecido, dizemos que a pessoa está imunocomprometida.

 

Fig 1. Ilustração de diferentes tipos leucócitos (glóbulos brancos do sangue). Todos são células do sistema imunitário. Cores-fantasia. Créditos: Tetiana Lazunova/iStock, adaptado por Invivo.

 

Imuno… O quê?

O imunocomprometimento pode ter várias causas. Segundo a Dra. Eliane Matos dos Santos, médica da Assessoria Clínica de Bio-Manguinhos/Fiocruz, é importante entender melhor esse conceito. “A imunodepressão é uma diminuição da resposta imunitária devido a certas doenças, como o HIV, doença renal crônica e o câncer, por exemplo. Imunossupressão é uma diminuição da resposta imunitária devido ao uso de algumas medicações (como corticoides e medicamentos usados em doenças autoimunes)”, explica.

Ficou na dúvida sobre esses últimos tópicos? Calma, nós vamos ajudar! Os corticoides são um tipo de hormônio com ação anti-inflamatória e imunossupressora. E as doenças autoimunes acontecem quando sistema imunológico “se engana” e ataca células saudáveis do organismo. Artrite reumatoide, diabetes mellitus tipo 1 e lúpus são exemplos de doenças autoimunes.

Atualmente, o número exato de imunocomprometidos no Brasil e no mundo é incerto. Dados do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, sigla em inglês), órgão de saúde dos Estados Unidos, mostram que, em 2013, quase 3% dos adultos daquele país estavam imunossuprimidos ou imunodeprimidos. Especialistas, porém, acreditam que essa porcentagem esteja aumentando em decorrência dos avanços da medicina, que têm proporcionado aumento da expectativa de vida desse grupo e também levado ao desenvolvimento de novos tratamentos imunossupressores.

 

 

Faço parte do grupo de imunossuprimidos e imunodeprimidos. Posso me vacinar?

Em geral, os imunossuprimidos e imunodeprimidos são mais suscetíveis a infecções evitáveis por vacina. Uma vez contaminadas, elas podem apresentar quadros mais graves. Além disso, as vacinas também podem ser menos eficientes nessas pessoas. No entanto, vale lembrar que cada pessoa é única. Características pessoais devem ser consideradas.

Nas situações em que é possível programar quando ocorrerá o enfraquecimento do sistema imune, tal como no caso de transplante de órgãos e quimioterapia, a recomendação do Ministério da Saúde é realizar a imunização com vacinas que não possuem agentes infecciosos vivos, pelo menos, duas semanas antes do início da imunossupressão. Já as vacinas que contêm agentes infecciosos vivos, como, por exemplo, BCG (que protege contra a tuberculose), rotavírus, febre amarela, tríplice viral (que protege contra sarampo, caxumba e rubéola) e tetraviral (que protege contra sarampo, caxumba, rubéola e varicela) devem ser realizadas, pelo menos, quatro semanas antes da imunossupressão. “A literatura tem mostrado cada vez mais a importância de doses de reforço após o período de imunodepressão em algumas condições clínicas, na tentativa de fortalecer a resposta imune, explica a especialista de Bio-Manguinhos/Fiocruz.

De maneira geral, lembrou a Dra. Eliane, pessoas gravemente imunocomprometidas ou aquelas em que não é possível determinar o estado imunológico não devem receber vacinas com agentes infecciosos vivos devido ao risco de desenvolver quadros graves das doenças que pretendiam evitar. “Em pessoas menos severamente imunocomprometidas, os benefícios da vacinação com vacinas vivas rotineiramente recomendadas podem superar os riscos. Antes de administrar uma vacina viva a uma pessoa imunocomprometida, um médico deve ser consultado”, destaca, lembrando que, em alguns casos, pode haver indicação de utilizar imunizantes com formulações especiais disponíveis nos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais (CRIEs), unidades do Programa Nacional de Imunizações (PNI), coordenado pelo Ministério da Saúde.

 

E as vacinas contra a Covid-19?

Os pacientes imunocomprometidos não fizeram parte dos estudos de eficácia para registro das vacinas contra a Covid-19. No entanto, segundo a Dra. Eliane, as primeiras pesquisas feitas nessas populações, particularmente em pessoas com HIV e doenças reumatológicas, têm mostrado que os imunizantes são seguros e eficazes também nesses grupos.

Em dezembro de 2021, o Ministério da Saúde adotou o uso de uma dose de reforço da vacina contra a Covid-19 em indivíduos imunocomprometidos, com idade acima de 18 anos, que receberam três doses no esquema primário (duas doses e uma dose adicional). A quarta dose deve ser administrada a partir de quatro meses da dose adicional.

O público-alvo dessa medida são as pessoas com imunodeficiência primária grave, em quimioterapia para câncer, transplantados que fazem uso de imunossupressores, pessoas com HIV/aids, pessoas em uso contínuo de corticóide e imunoterápicos, além de pessoas em hemodiálise ou com doenças inflamatórias crônicas.

 

Fontes consultadas:

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Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis. Manual dos Centros de Referência para Imunobiológicos Especiais [recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis, Coordenação-Geral do Programa Nacional de Imunizações. – 5. ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2019. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_centros_imunobiologicos_especiais_5ed.pdf. Acessado em 24 de janeiro de 2022.

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Por Teresa Santos

Data Publicação: 27/05/2022