Por: Irene Cavaliere
Fim-de-semana de sol, sua família foi passar o dia na praia. Você brincou na areia com seu primo mais novo, pegou onda, achou conchas incríveis para sua coleção… No dia seguinte, começou a sentir uma coceira insuportável no pé. Seu primo também ficou com uma picada de bicho esquisita, no bumbum! No outro dia, a picada estava maior, parecia um traço, como se um mapa estivesse sendo desenhado na pele de vocês dois. E como coça!
A pesquisadora Delir Serra Freire, chefe do Laboratório de Helmintos Parasitos de Vertebrados do Instituto Oswaldo Cruz, explica: “trata-se de uma síndrome clínica denominada ‘larva migrans cutânea’ ou ‘dermatite serpiginosa’, causada pela forma larvária de terceiro estádio do helminto Ancylostoma braziliense, parasito de gatos (mais frequente), ou do Ancylostoma caninum, parasito de cães.”
Ou, em linguagem popular, é o que chamamos de bicho geográfico, um verme que, na forma adulta, vive no intestino delgado de cães e gatos. Lá, os vermes acasalam e a fêmea põe ovos que saem junto com as fezes do animal hospedeiro. Do lado de fora, esses ovinhos viram larvas, que penetram novamente nos cães e gatos pela pele ou pela boca. Chegando ao intestino, as larvas finalizam o seu desenvolvimento, viram adultos e o ciclo recomeça.
Nas pessoas, a contaminação ocorre quando entramos em contato com areia da praia ou terrenos arenosos onde cães e gatos infectados fizeram cocô. A larva penetra na pele, geralmente nos pés, pernas, mãos, antebraços e bumbum. Ela não consegue chegar ao intestino do homem, mas a movimentação da larva sob a pele provoca uma coceira enlouquecedora, podendo ocasionar infecções secundárias por micróbios. Ela vai fazendo um túnel e pode avançar de 2 a 5 centímetros por dia! Nos animais, o Ancylostoma causa anemia, pois o helminto adulto fica se alimentando do sangue dos bichinhos.
É por isso que seus pais e as autoridades sanitárias não deixam que você leve seu animal de estimação para a praia. Esse tipo de parasito gosta de terrenos arenosos e lugares quentes e úmidos, e apesar de poder ser encontrado em todos os continentes, aparece com mais frequência nos países tropicais. Como ele não sobrevive em terrenos com sal, a areia onde o mar avança não oferece risco.
Só há uma maneira de prevenir o bicho geográfico: tratar os animais contaminados e não deixar que cães e gatos frequentem praias. Mesmo que as fezes sejam retiradas da areia, é muito difícil descontaminar a área infestada, e a próxima pessoa ou animal que passar por ali vai pegar o parasito. Para diminuir o risco de contágio, evite andar descalço e sentar diretamente na areia – chinelos, cangas e toalhas devem sempre fazer parte da sua mochila de praia!
“Para fazer o tratamento, é preciso procurar um médico que prescreva a medicação, oral ou local, e a dose correta. Nos animais, apenas um veterinário pode indicar o vermífugo específico”, orientou Delir. A pesquisadora também explicou que o contato com areia infestada é a única forma de contágio nos seres humanos, não ocorrendo contaminação por toalhas, roupas ou de pessoa para pessoa. E essa história de que coçar faz o verme caminhar mais ou que a unha pode transportar a larva de uma parte do corpo para outra também é mito.
Mas não confunda o bicho geográfico com o famoso bicho-de-pé (aquele que volta e meia aparece nos quadrinhos do Chico Bento). O bicho-de-pé é outro tipo de animal, uma pulga chamada Tunga penetrans, que também provoca muita coceira!
Consultoria científica:
Delir Corrêa Gomes Maués da Serra Freire – Laboratório de Helmintos Parasitos de Vertebrados do IOC.
Referência bibliográfica:
REY, Luís. Parasitologia. Parasitos e doenças parasitárias do homem nas Américas e na África. 3ª ed.. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. pp. 615-616.
Data Publicação: 02/12/2021